sábado, 29 de setembro de 2007

PERCURSOS DE POESIA

Nascido em Lisboa, em 1959, no mês de Janeiro, mês dos gatos, numa época em que em Portugal se viviam tempos difíceis, e em Cuba se assaltava o Quartel Moncada, pela mão de Ernesto Che Guevara, mudando o rumo da história do Mundo, depressa conheceu na escrita e na poesia, uma forma alternativa de se expressar e de deixar um testemunho neste mundo, tentando através dela deixar uma mensagem:

Fazer-se ao caminho, com o sol no rosto, olhando a vida de frente, um PERCURSO de vida.







ZECA I

TU QUE AINDA ERGUES NA TUA VOZ
A CERTEZA DA RAZÃO .
FILAS E FILAS DE CORPOS MUTILADOS
Á ESPERA DE JUSTIÇA .
MIÓSOTIS DE LOUCURA DESFRALDADA
NUM DIA DE ABRIL
ESCUTA-ME COMPANHEIRO E IRMÃO ,
ESCUTA-ME PORQUE TU EXISTES .
VAMOS FESTEJAR-TE A VIDA
NAQUELE SÍTIO DO COSTUME
ONDE TE ENCONTREI TANTAS VEZES
A SONHAR .

ZECA II

MORREM-NOS OS POETAS NA CALADA DA NOITE
E DEIXAM-NOS PRÁ AQUI
PERDIDOS
NAS BRUMAS DA NOTÍCIA
NO DESESPERO DA REALIDADE
E SÓ NOS APETECE CHORAR.
GRACIAS A LA VIDA !
PORQUE SÓ A MORTE
NOS DÁ A DIMENSÃO DO EXISTIR !

do autor


POESIA OCULTA

OCULTO A MINHA POESIA
NO REGAÇO DA NOITE ,
E DELA FAÇO O QUE QUERO .
POR VEZES SAIO .
VOU ATÉ Á PRAIA
BRINCO NA AREIA
E PARTO PARA LONGE DE MIM MESMO .
O TEU OLHAR
É UM POEMA SEM SENTIDO
E A VIAGEM QUE EU FAÇO NELE , TAMBÉM .
A INDISCRITÍVEL INOCENCIA DAS PALAVRAS .
TRAI-ME .
EXPONHO OS SENTIMENTOS
NO ESTENDAL DA ROUPA
PONHO-LHES MOLAS PARA NÃO VOAREM .
NO CÊU AZUL
GRACEJAM GAIVOTAS
E OS SENTIMENTOS HÚMIDOS
DAS NOITES LOUCAS QUE VIVI
AGITAM-SE COMO CARRILHÕES SONOROS .
QUEM ME DERA AMANHÃS PARA SEMPRE

do autor





PÚBIS
MERGULHO NOS TEUS OLHOS
EM CADA OLHAR ,
NO DIA A DIA .
TENTANDO ESQUECER-TE
Ó GAIA ,
MÃE NATUREZA , MULHER FRONDOSA .
ERGUES OS TEUS DEDOS
COMO RAMOS NO CÉU .
E AS ESTRELAS BEIJAM-NOS ,
TAL COMO EU .
DESCANSO Á TUA SOMBRA
SENTINDO A TUA PÚBIS
DE MANSINHO NO MEU ROSTO .
BEIJO-TE O CLITÓRIS
Ó TERRA
E O TEU ORGASMO
BEBO-O .
COMO É BOM VOAR NO ESPAÇO ,
EMBALADO ,
PELO SOM DOS TEUS CABELOS .


do autor


Sei os teus seios.
Sei-os de cor.

Para a frente, para cima,

Despontam, alegres, os teus seios.

Vitoriosos já,

Mas não ainda triunfais.

Quem comparou os seios que são teus

(Banal imagem) as colinas!

Com donaire avançam os teus seios,

Ó minha embarcação!


Porque não há

Padarias que em vez de pão nos dêem seios

Logo p'la manhã?


Quantas vezes

Interrogastes, ao espelho, os seios?

Tão tolos os teus seios!

Toda a noite

Com inveja um do outro, toda a santaNoite!


Quantos seios ficaram por amar?

Seios pasmados, seios lorpas, seios

Como barrigas de glutões!

Seios decrépitos e no entanto belos

Como o que já viveu e fez viver!

Seios inacessíveis e tão altos


Como um orgulho que há-de rebentar

Em desesperadas, quarentonas lágrimas...

Seios fortes como os da Liberdade

-Delacroix-guiando o Povo.


Seios que vão à escola p'ra de lá saírem

Direitinhos p'ra casa...


Seios que deram o bom leite da vida

A vorazes filhos alheios!


Diz-se rijo dum seio que, vencido,

Acaba por vencer...

O amor excessivo dum poeta:

"E hei-de mandar fazer um almanaque

da pele encadernado do teu seio"


Retirar-me para uns seios que me esperam

Há tantos anos, fielmente, na província!

Arrulho de pequenos seios

No peitoril de uma janela

Aberta sobre a vida.


Botas, botirrafas

Pisando tudo, até os seios

Em que o amor se exalta e robustece!

Seios adivinhados, entrevistos,


Jamais possuídos, sempre desejados!

"Oculta, pois, oculta esses objectos

Altares onde fazem sacrifícios

Quantos os vêem com olhos indiscretos


"Raimundo Lúlio, a mulher casadaQue cortejastes, que perseguistes

Até entrares, a cavalo, p'la igreja

Onde fora rezar,

Mudou-te a vida quando te mostrou

("É isto que amas?")

De repente a podridão do seio.


Raparigas dos limões a oferecerem

Fruta mais atrevida: inesperados seios...

Uma roda de velhos seios despeitados,

Rabujando,A pretexto de chá...


Engolfo-me num seio até perder

Memória de quem sou...

Quantos seios devorou a guerra, quantos,


Depressa ou devagar, roubou à vida,

À alegria, ao amor e às gulosas

Bocas dos miúdos!


Pouso a cabeça no teu seio

E nenhum desejo me estremece a carne.

Vejo os teus seios, absortos

Sobre um pequeno ser

de Alexandre O Neill



Não posso

adiar o amor para outro século

não posso

ainda que o grito sufoque na garganta

ainda que o ódio estale e crepite e arda

sob as montanhas cinzentas




Não posso adiar este braço

que é uma arma de dois gumes amor e ódio


Não posso adiar

ainda que a noite pese séculos sobre as costas

e a aurora indecisa demore


não posso adiar para outro século a minha vida

nem o meu amor

nem o meu grito de libertação.


de António Ramos Rosa




Original é o poeta

que se origina a si mesmo

que numa sílaba é seta

noutro pasmo ou cataclismo

o que se atira ao poema

como se fosse um abismo

e faz um filho ás palavras

na cama do romantismo.


Original é o poeta

capaz de escrever um sismo


de Ary dos Santos



Como te Amo Garcia Lorca

como te amo ó poesia.
Posso dizer-te o indizível , e viajar.
Partir na estrada sem destino
cavalgando mil noites,
sonhando com pássaros de fogo
em florestas de paixão.
Apesar de tudo, e até que a morte chegue
a vida não me desiludiu.
Os homens sim!
Remeto esta carta sem destinatário
para quem a quiser ler.
Amo-te mulher
e não te amo.
Só na imensa multidão
não me quero apaixonar, apenas viver.
Tenho medo de sofrer.
Amar-te sim, como Garcia Lorca
amou a vida.

do autor

Viver é ser outro. Nem sentir é possivel se hoje se sente como ontem se sentiu: sentir hoje o mesmo que ontem não é sentir - é lembrar hoje o que se sentiu ontem, ser hoje o cadáver vivo do que ontem foi a vida perdida.

Apagar tudo do quadro de um dia para o outro, ser novo com cada nova madrugada, numa revirgindade perpétua de emoção - isto, e só isto,vale a pena ser ou ter, para ser ou ter o que imperfeitamente somos.

Esta madrugada é a primeira do mundo.Nunca esta cor de rosa amarelecendo para branco quente pousou assim na face com que a casaria de oeste encara cheia de olhos vidrados o silêncio que vem na luz crescente. Nunca houve esta hora,nem esta luz, nem este meu ser. Amanhã o que for será outra coisa,e o que eu vir será visto por olhos recompostos, cheios de uma nova visão.

.... sois hoje,sois eu,porque vos vejo, sois o que (serei?) amanhã, e amo-vos da amurada como um navio que passa por outro navio e há saudades desconhecidas na paisagem.

de BERNARDO SOARES




Tempo Em Que Se MORRE

Agora é verão, eu sei.
Tempo de facas, tempo
em que perdem os anéis
as cobras à míngua de água.


Tempo em que se morre
de tanto olhar os barcos.


È no verão, repito.
Estás sentada no terraço
e para ti correm todos os meus rios.


Entraste pelos espelhos:
mal respiras.
Vê-se bem que já não sabes respirar,
que terás de aprender com as abelhas.
Sobre os gerânios
te debruças lentamente.
Com rumor de água
sonâmbula ou de arbusto decepado
dás-me de beber
um tempo assim ardente.

Pousas as mãos sobre o meu rosto,
e vais partir
sem nada me dizer,
pois só quiseste despertar em mim
a vocação do fogo ou do orvalho.


E devagar, sem te voltares
pelos espelhos entras na noite.

de Eugénio de Andrade





No meu amor canto a Liberdade
de amanhecer contigo em pensamento
e há uma palavra que rima com saudade
e ela tem a força deste forte vento .
No meu amor encanto a liberdade
com as palavras justas no momento certo
e não te minto , se te falo em alvoradas
quando nossas pernas estão entrelaçadas
e nossos corpos navegam enleados

do autor



A POESIA DAS PALAVRAS

NÃO CHEGA PARA DIZER COMO ESTOU FELIZ
POR TE TER ENCONTRADO .
EXPLODEM CAVALOS DE FOGO NO MEU PEITO
VOANDO VELOZES COMO PÉGASOS , NA TORMENTA DAS CORES DO PRISMA .
A TUA AMIZADE É - ME TÃO PRECIOSA
COMO ESMERALDAS NA SUA PUREZA DE MIL BRILHOS .
E O CÊU FICOU UM POUCO MAIS AZUL
APESAR DAS NUVENS QUE O TENTAM ENCOBRIR .
EM VÃO .
HÁ ESTADOS DE ALMA , QUE QUANDO SE VIVEM
SÃO COMO SE FOSSEM CANÇÕES DE MUSAS EM ILHAS PERDIDAS .
E SÓ ALGUNS SONHADORES
CONSEGUEM VIVÊ – LOS .
É PRECISO TER UNS OLHOS LINDOS COMO OS TEUS
DO TAMANHO DO MUNDO
PARA SENTIR . SIM PARA SENTIR .
SENSÍVEL COMO TU , CONHEÇO POUCAS PESSOAS
TRANSMITES –ME UMA PAZ LINDA .
LINDA , ALIÁS COMO TU .
POR ISSO TE AMO CALMAMENTE
DIA A DIA, SEM PRESSAS, INFINITAMENTE

do autor

Amar

Que pode uma criatura senão

entre criaturas, amar ?

amar e esquecer

amar e malamar,

amar, desamar, amar ?


sempre, e até de olhos vidrados, amar ?

Que pode, pergunto, o ser amoroso,

sozinho, em rotação universal, senão

rodar também , e amar ?

amar o que o mar traz à praia,

o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,

é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia ?


Amar solenemente as palmas do deserto ,

o que é entrega ou adoração expectante,

e amar o inóspito , o áspero,

um vaso sem flor , um chão de ferro ,

e o peito inerte, e a rua vista em sonho , e uma ave de rapina.


Este o nosso destino : amor sem conta,

distribuído pelas coisas pérfidas e nulas ,

doação ilimitada a uma completa ingratidão,

e na concha vazia do amor a procura medrosa ,

paciente, de mais e mais amor.


Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa

amar a água implícita, e o beijo tácito , e a sede infinita.

de Carlos Drummond de Andrade


O CORPO , ERÓTICO NA PROXIMIDADE DA ÁGUA

SERÁ UM AREAL ESPERANDO A FÚRIA DA ESPUMA .

ATÉ O MEU SEXO FERIR

A SUA CONSISTENCIA APARENTE ,

ESTÁ DEITADO E IMÓVEL , DOURADO AOS MEUS OLHOS IMPACIENTES.


TORNAR-SE-Á ENTÃO MAIS AQUÁTICO

REPETINDO O MOVIMENTO REPETIDO DAS VAGAS

EMBALARÁ O DESEJO QUE O FEZ MOVER-SE


II


ESTÁS COMO UM ANIMAL A MEUS PÉS

E ENTREGAS-TE-ME COMO ÉS

A VIDA É SIMPLES E É SIMPLES AMÁ-LA

TUDO O MAIS NÃO PASSA DE CHARADAS :

DIALÉTICA NÃO COMPRA AMOR .


SOMOS DOIS ANIMAIS AMANDO-SE SEM CULPAS

E O MEDO QUE SENTIMOS É SÓ O NATURAL .

NÃO EMBELEZEMOS A VIDA PORQUE EMBELEZÁ-LA

É RETIRAR-LHE A BELEZA QUE ELA TEM E TU TAMBÉM .

Nova poesia brasileira



A poesia não se escreve
só com canetas
também com lápis, aparos a tinta da china
uma fotografia, um óleo que se dá
um som que se torna audível
um passo de dança para além do que é possível
um filme a muitas imagens por segundo
ou uma peça de teatro onde ninguém é todo o mundo.
Tudo isto é poesia.
È tudo, e o mais que houver.
Já que quase nada disse
Já que disse quase tudo.
E torna-se absurdo.

do autor

Quase que já conheço os teus silêncios.
Tudo o que dizes quando calas.
As tuas perigrinações astrais
quando sais do corpo,por momentos
e nos deixas a sós,comuns mortais.
serão silencios prolongados?
São momentos como esses, em que tu “escreves”
com tintas coloridas,
e fazes um mundo diferente só para nós.Quando traças numa folha o teu riscado
presinto o ser de uma pessoa notável
num desenho iluminado,
com um sol ao fundo, e duas almas voláteis.
Àfrica foi uma viagem.
Mais do que isso, uma voragem.
E os quadros que acalentas no sossego do teu lar,
são paisagens soltas.
E se lá voltares dir-te-ão:


“Haisikoti hasilambalawa kefuma
no K'omufuko wendobwa”

( as grandes rãs, ó chuva, saúdam a tua vinda, e as aves aquáticas também”)

do autor


Se a poesia fosse sangue
era só cortar as veias
e deixar-me ir.
O chão manchado de poemas
e o médico legista
que se punha a ler.

Mas a poesia é como fogo
é uma chama e arde sem se ver
é estar contigo na cama
e vir-me em ti e então morrer.

Afogar meu manto de mágoas
em poemas e sémen
que saboreias de gulosa
e ter-te assim tão ditosa
estrofe minha, a mais molhada.

Sentir teu cheiro a sexo molhado
nos meus lábios
e ter-te assim ó poesia.
Como vinho doce, em festa amarga
e uma sílaba em cada palavra
que se estraga.

do autor




O TEJO È O RIO DA MINHA ALDEIA

O Tejo não se escuta
é um silêncio a correr para o Bugio.
Uma calma com gaivotas
e uns pequenos pássaros brancos
que andam no lodo.

O Tejo é o rio da minha aldeia.
Umas centenas de Quilómetros quadrados
cerca de meio milhão de habitantes,
sete colinas e um Castelo,
e a tua casa no meio da cidade.

No meio da cidade não há silêncio,
junto ao Tejo sim.

Vejo poucos barcos.
Os marinheiros estão fechados em escritórios
fechados no betão
no meio das centenas de quilómetros quadrados
onde vive o tal meio milhão.
Onde não há silêncio.
Onde não se escutam as aves matinais
onde se não amanhece.

O Tejo é sem sombra de dúvida
o rio da minha aldeia.
Ruas pequenas, estreitas, de roupa estendida,
onde cheira a fruta
onde habita o sonho.

No meio da cidade
as avenidas engolem automóveis,
vorazes.
È onde se grita o protesto
onde tudo acontece.

No meio do Tejo a paz.
No meio da cidade vende-se amor barato,
e os heroínómanos injectam-se nas calçadas
com o despudor
do século XXI.

Nada de novo,nada de bom
numa cidade tão linda com pedaços apodrecidos.
Escorbuto de vidas
puz de sonhos, auténticos pesadelos.

È esta a cidade, bonita e feia
onde corre o rio que banha a minha aldeia.

do autor



Relembro aqui com saudade o Espaço Cefalópode nas noites de "Reverso da Palavra" com "Roda de Choro"

Noites em que dizia poesia para tanta gente apaixonada pela literatura


Apetece-me

Apetece-me deitar o meu corpo ao mar
e deixar que a tsunami
que me invade o ser e a geografia,
me afogue
lentamente,sem hipocresia.

Apetece-me fugir dos problemas
que me afligem
sem fugir deles, enfrentando-os.
Como o cavaleiro destemido
ou argonauta temerário
fazer da cruz, a cruz de um templário.

Apetece-me um bom copo de vinho
e uma foda a seguir.
Apetece-me fugir
pró Kosovo, ou para o Irão
sem saber porque partir
sem escolher o avião
com o passaporte na mão
e uma mala de cartão.
A fotografia do meu cão
e um livro
e para acompanhar Licor Beirão

O Licor de Portugal.

do autor





Espero que tenha gostado

Quis com este blog unir as pessoas em torno de 3 questões:

Direitos humanos, divulgar alguns movimentos alternativos na área da cultura, do ambiente, do ecoturismo, e pequenas factos relevantes, a que estão ligados amigos, e acima de tudo a poesia que escrevo , e alguma da belissima poesia que se vai fazendo, para manter viva a chama do REVERSO DA PALAVRA, movimento de poetas, ao qual pertenço com muito orgulho, que pretende unir os amigos, e criar correntes positivas.